MUITO PRAZER

Agradeço sua visita em meu blog e desejo que lhe seja útil. Se precisar de algum tipo de orientação acadêmica, estou à disposição na Faculdade de Cmunicação Social da PUCRS/Porto Alegre.

Thursday, July 08, 2010

Nelson Traquina

NELSON TRAQUINA

QUEM É O AUTOR
Nelson Traquina é responsável pela introdução do jornalismo, enquanto objeto de estudo e de investigação, no ensino universitário de Portugal. Licenciado em Política Internacional pela Assumption College, dos Estados Unidos, o pesquisador é mestre em Política Internacional e em Comunicação Política e Social. Fez doutorado em Sociologia, em Paris, com equivalência para Comunicação Social. Entre suas obras estão Viagem pelo mundo audiovisual português, Jornalismo: questões, teorias e estórias, O quarto poder frustrado: os meios de comunicação social no Portugal pós-revolucionário, O estudo do Jornalismo no século XX e O poder do Jornalismo: análise e textos da teoria do agendamento.

OS LIVROS

O poder do Jornalismo: análise e textos da Teoria do Agendamento
A partir da perspectiva dos fundadores da teoria do agendamento – Maxwell E. McCombs e Donald L. Shaw –, Traquina fala da influência e do poder do jornalismo na sociedade contemporânea a partir de efeitos cognitivos que produz. Dos assuntos que seleciona à visibilidade que produz, a mídia expõe a realidade e reconfigura uma nova visão do mundo.

Primeira parte: Análise
Quando o conceito de agendamento surgiu pela primeira vez (em um artigo de 1972, publicado em uma revista acadêmica norte-americana e assinado por McCombs e Shaw), o paradigma apontava os meios de comunicação como detentores de poder, mas de forma reduzida e de efeitos limitados. Em mais de 20 anos de existência, a teoria do agendamento passou por uma grande evolução: seu conceito ganhou amplitude e complexidade, enquanto o poder da mídia conquistou reconhecimento.
A teoria do agendamento esteve na maior parte de sua existência ligada a campanhas políticas norte-americanas (onde surgiu o termo). Neste contexto, acredita-se que a mídia exercia papel fundamental na formação da opinião do eleitorado. O papel dos meios de comunicação se transformou em essencial na decisão de voto devido à crescente importância das questões discutidas nas campanhas políticas em detrimento da identificação partidária.
Embora a teoria dos “efeitos” tenham gerado pouco entusiasmo entre os pesquisadores europeus da comunicação, o grupo norte-americano do communication research se demonstrava interessado em compreender o paradigma. Os pesquisadores fizeram, então, seus primeiros estudos no campo da investigação da propaganda, durante e depois a I Guerra Mundial.
O trauma do grande conflito e as experiências totalitárias naquele período, paralelo ao surgimento de meios de comunicação massivos, promoveram a preocupação dos pesquisadores. A partir daí, surgiram paradigmas dos estudos dos “efeitos” , como a teoria hipodérmica – a qual defendia que as mensagens dos meios de comunicação tinham impacto direto nas pessoas, produzindo comportamentos previsíveis.
Durante os anos 40, novos métodos de coleta de informações e análises produziram conclusões que contradiziam a teoria hipodérmica. Lazarsfeld, por exemplo, após estudos de campo, afirmou que a mídia oferecia efeitos limitados nas campanhas políticas. Para ele, a mensagem midiática entrava em conflito com as normas do grupo e era rejeitada. Depois, as pessoas consumiam as mensagens de forma seletiva. Este pensamento, dominante nos anos 60, foi chamado de a teoria dos “efeitos limitados”.
Representando um regresso à problemática dos efeitos, a teoria do agendamento (agenda-setting) surgiu nos anos 70. Ao contrário da longa tradição do estudo dos efeitos em analisar a mudança de atitudes e opiniões, o trabalho de McCombs e Shaw visava examinar o papel dos media na formação e mudança de cognições.
De acordo com Traquina, a teoria foi inicialmente avançada nas conclusões de um estudo publicado em 1972, cujo trabalho de campo foi realizado nas eleições norte-americanas de 1968. A amostra baseou-se em cem eleitores indecisos, considerados os mais abertos e suscetíveis à mudança de opinião e de posicionamento sobre a política. A agenda pública de questões eleitorais destes cidadãos era medida agregando suas respostas a uma questão de enquadramento sobre os assuntos que mais os preocupavam naquele momento. O maior número de menções era utilizado para indexar a agenda política.
Com o desenvolvimento das primeiras pesquisas na área, McCombs e Shaw abriram novas linhas de investigação. De acordo com Rogers, Dearing e Bregman (apud Traquina, 2000), a literatura do agendamento abarca três áreas: os estudos da agenda midiática, os estudos da agenda pública e os estudos sobre a agenda política governamental. Para os autores, o processo é definido da seguinte forma:



Para Traquina (2000), a agenda midiática dos estudos de agendamento é, de fato, a agenda dos media noticiosos e do jornalismo. Na perspectiva de uma teoria da notícia, a análise do campo jornalístico que Molotch e Lester (1974) apresentam possuem três categorias de pessoas, posicionadas de forma diferente: os promotores de notícia, os news assemblers (aqueles que transformam ocorrências em acontecimentos públicos) e os consumidores de notícias. Para o agendamento, os consumidores são os indivíduos sujeitos às ações da mídia, os news promoters são os responsáveis por promover a agenda política do governo e os news assemblers determinam a agenda jornalística.
Na luta política, foco principal do estudo, percebeu-se que o objetivo consistia em fazer coincidir as suas necessidades de acontecimento com as dos profissionais do campo jornalístico. Os próprios jornalistas podem ser promotores de notícias, com suas investigações e reportagens. Como, quem e sobre que assuntos influenciam são algumas das questões desta linha de investigação.
Na constituição da agenda jornalística, o autor aponta variáveis determinantes:
1) a atuação dos jornalistas e os critérios de noticiabilidade que utilizam;
2) a ação estratégica para promover a notícia e os recursos de possuem para mobilizar o campo jornalístico.

Na verdade, as notícias são denominadas como construções narrativas, histórias, uma realidade seletiva. É preciso reconhecer quais os acontecimentos possuem valor como notícia. Após este reconhecimento, o jornalista precisa orientar-se para elaborar a notícia. O saber da narração consiste em compilar todas essas informações e transforma-las em mensagens. A construção da notícia exige a utilização de enquadramentos, um conceito aplicado por Ervin Goffmann à forma como são organizadas a vida e as situações sociais. É um dispositivo interpretativo de seleção.
Traquina (2000) afirma que para McCombs e Shaw, o agenda-setting é mais do que produzir notícias sobre o que pensar. Tanto a seleção de objetos que despertam a atenção quanto os enquadramentos são essenciais para o agendamento. A mídia só diz o que pensar, e não como pensar.
Em uma vertente da evolução da teoria do agendameto, o autor cita Behr e Iyengar. Os pesquisadores concluíram que a agenda jornalística é imune às mudanças da agenda pública enquanto a influência da agenda jornalística sobre a agenda pública é imediata. São estes autores os responsáveis pela idéia de que o agendamento funciona mais nas pessoas que participam mais, pois a necessidade de orientação tem a ver com o alto interesse e grau de incerteza. Além disso, foi confirmado que o impacto do agendamento não é igual a todos e depende da necessidade de orientação e da natureza do assunto.
Para Traquina (2000), a teoria do agendamento funciona como uma redescoberta do poder do jornalismo, no qual o jornalista se transforma em construtor da realidade. Neste caso, só a cegueira permitiria pensar que o trabalho do profissional limita-se à identificação dos fatos ou as escolhas sobre o que transmitir.
Em uma realidade em que as informações veiculadas pelos meios de comunicação algumas vezes são as únicas recebidas pela população, os eleitores adquirem conhecimentos através destas informações. E a teoria ajuda a compreender o papel do jornalismo hoje.


O estudo do jornalismo no século XX

Capítulo 1: A redescoberta do poder do jornalismo
“A capacidade da mídia em influenciar a projeção dos acontecimentos na opinião pública confirma o seu importante papel na figuração da nossa realidade social, isto é, de um pseudo-ambiente, fabricado e montado quase completamente a partir dos mass media (McCombs e Shaw, 1972)”.

Depois de 30 anos da teorização de McCombs e Shaw, Traquina faz em sua obra uma análise da evolução do agendamento. Tendo em vista que o agenda-setting tem relação direta com eleições presidencias nos EUA nos anos 70, o autor identifica duas mudanças no conceito: a crescente complexidade do conceito inicial e o reconhecimento mais claro do poder midiático imaginado naquela década.
Com estes conceitos, Traquina traça sua análise:

Ø Os estudos sobre “efeitos” de Shaw e McCombs não foram novidade em 1972. Em 1963 já havia a teoria hipodérmica, a qual pregava que “cada indivíduo é um átomo isolado, que reage isoladamente às ordens e às sugestões dos meios de comunicação de massa monopolizados” (Wright Mills). O nazismo, por exemplo, enquanto manifestação político-social, dava créditos a este tipo de pensamento.

Ø Além disso, os estudos de Lazarsfeld já cogitavam uma absorção racional/parcial por parte do receptor: “Primeiro, se a mensagem entra em conflito com as normas do grupo, a mensagem será rejeitada. Segundo, as pessoas consomem as mensagens midiáticas de forma seletiva” (Traquina, 2000, p.16). Este pensamento deu origem a teoria dos efeitos limitados, a qual acredita que a mídia não impõe ou muda atitudes do cidadão, apenas cristaliza suas ideologias já existentes.

Ø Observando as evoluções dos últimos 60 anos, Traquina (2001) notou que as análises mais recentes destoavam da matriz pensada por McCombs. Tanto que diz parecer óbvia a conclusão de que, no início do século 21, não se avançará na questão do agendamento sem estudar o jornalismo como um fazer diário e concreto – levando em consideração a relação repórter/fonte.

Ø Para o autor, “torna-se insustentável negar o papel ativo do jornalista na construção da realidade social. Só a cegueira provocada pela ideologia jornalística pode explicar que alguns jornalistas insistam em pretender que o seu trabalho se limite à identificação dos fatos e à simples recolha e transmissão de relatos”.

Capítulo 2: Teorias da Notícia – o Estudo do Jornalismo no Século XX

O autor cita que, para alguns estudiosos, a cibermídia estaria fazendo do jornalista uma espécie em extinção. Traquina considera muito precoce este tipo de projeção catastrófica para a classe. Mas alerta que talvez seja o momento de fazer um balanço sobre o estudo do jornalismo que foi desenvolvido no século passado.

Neste balanço, o jornalismo é analisado desde o início do século. Em 1918, Max Weber escreveu sobre notícias, sendo seguido em 1922 por Robert Park. No mesmo ano, Walter Lippmann publicou o livro Opinião Pública, no qual já se referia aos meios de comunicação a função de principal elo entre os fatos e as imagens destes acontecimentos na mente de cada um. Para Traquina, este foi o nascedouro, a inspiração para McCombs formular 50 anos depois a teoria do agenda-setting.
Em 1950, David White batiza um estudo de gatekeeper, originando uma das tradições mais persistentes na pesquisa sobre notícias. A teoria do gatekeeper prega que o processo de produção das notícias é conhecido como uma série de escolhas, onde um fluxo de notícias tem de passar por diversos “portões” (gates), que são momentos de decisão em relação aos quais o gatekeeper (o jornalista) tem de decidir se vai escolher ou não essa notícia. Esta análise, que vingou nas décadas de 60 e 70, vislumbrada ainda na de 90, era baseada em estudos quantitativos e análise de conteúdo.
Entre as décadas de 70 e 80, surge um grupo de estudiosos reunidos sobre o tema Estudos da Parcialidade, que partem do pressuposto de que a notícia deve refletir a realidade sem distorção. Linhas divergentes surgiram a partir desta definição. De um lado, Lichter e Rothman (1986) argumentam que os jornalistas constituem uma classe com claras parcialidades políticas que distorcem as notícias para a propagação de opiniões anticapitalistas. De outro, Chomsky e Hermann (1979) argumentavam que a cobertura jornalística é distorcida pela subordinação dos mídia aos interesses das elites políticas e econômicas dos EUA. Ao menos, ambas linhas ratificam um pensamento conhecido na década de 70: a perspectiva da notícia como distorção.
Em resumo, as teorias que vingaram no século 20 são classificadas como:

1. Espelho
A mais antiga das teorias. Para ela, o jornalista é um comunicador desinteressado, que limita-se a reproduzir os fatos sem opinar ou refletir. Agências internacionais defenderam por longo tempo a lógica do espelho.


2. Gatekeeper
Analisa as notícias apenas a partir de quem a produz: o jornalista. Aborda apenas o indivíduo e seu poder de seleção dos fatos, ignorando quaisquer fatores sociológicos ou de mercado, externos ao seu lugar de trabalho.

3. Organizacional
O jornalismo depende do constrangimento a que o repórter é submetido em seu ambiente de trabalho. Prega que o jornalista conforma-se com as regras editorias e políticas da empresa a qual é funcionário e está preocupado mais com recompensas ou punições. O repórter escreve para agradar ao chefe e não ao leitor.

4. Ação Política
A mídia é vista como uma forma instrumentalista, servindo a certos interesses políticos. Na versão da esquerda, a mídia sustenta o capitalismo (Chomsky). Na visão da direita, a mídia se opõe ferrenhamente ao capitalismo. Direita e esquerda concordam numa coisa: as notícias são distorções sistemáticas que servem a agentes políticos.

5. Estruturalista
Vertente da teoria da ação política vista pela esquerda. Apesar de ratificar que há na mídia a reprodução de uma “ideologia dominante”, os estruturalistas admitem que os jornalistas têm uma autonomia. Há valores-notícias e fontes sem interesses políticos.

6. Etnoconstrucionista
Nesta teoria, os jornalistas vivem sob a tirania do relógio. O tempo é o senhor do produto final, que é a transformação diária da matéria-prima em notícia de jornal, rádio ou TV.

Capítulo 3: Jornalismo Cívico – Reforma ou Revolução?

Usa ações efetivas para melhorar as condições de vida do leitor. Segundo o jornalista David Merret, “somente jornalistas livres e independentes podem providenciar o bem público. O jornalismo tem ignorado as suas obrigações para com a vida pública e esta falência tem sido um contribuinte para o atual mal-estar do cidadão”.

Ele defende que o jornalismo cívico vai além da missão de noticiar, trocando o papel de observador desprendido para assumir a função de participante justo. Traquina contrapõe-se ao questionar: “Será realista tanto otimismo quanto à capacidade de mudança duma profissão tão marcada por rotinas e práticas, condicionada ao tempo e ao espaço? Será realista defender a posição que a existência de cidadãos conscientes depende do jornalismo?”

Capítulo 4 – Quem vigia o quarto poder?

O autor sintetiza seu livro colocando duas pressupostas características dos mass media que são conflitantes: a busca pelo lucro e a responsabilidade social. O autor avança concluindo que a liberalização econômica desfoca a mídia dos interesses sociais/humanos na essência. Por fim, apela para que proprietários e profissionais da mídia relembrem suas obrigações de defender a liberdade positiva da imprensa – dar aos cidadãos informações justas e significativas. E cabe ao cidadão vigiar e exigir tal comportamento.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

TRAQUINA, Nelson. O poder do Jornalismo – análise e textos da Teoria do Agendamento. Coimbra: Minerva, 2000. 146 p.

__________________. O estudo do jornalismo no século XX. São Leopoldo: Editora Unisinos, 2001


Friday, March 02, 2007

O Jornalismo e o Brasil

*Flávio Porcello


Pode parecer paradoxal: quanto mais espaço existe para noticiar, menos notícias há para dar. Falo de qualidade e não de quantidade. A tecnologia moderna acabou com as distâncias e encurtou o tempo. Hoje é possível falar de qualquer lugar do mundo para qualquer outro ponto do planeta. E até do espaço.


Mas fala-se para dizer o quê?


Espaços há de sobra: o que falta é conteúdo para preencher esses espaços. É oportuno citar o inglês John Thompson para lembrar que os governos autoritários calam a imprensa. Mas essa não é a única causa para censurar a informação: Uma explicação mais satisfatória das condições institucionais da liberdade de expressão no final do século XX deve levar em consideração de que tal liberdade está ameaçada não apenas pelo exercício irrestrito do Poder pelo Estado, mas, também, pelo crescimento desenfreado das organizações da Mídia no campo privado (THOMPSON, 1995:327).


O jornalista espanhol Xavier Mas de Xaxàs assinala queA las noticias les sobra ideologia y les falta originalidad y precision. (...) Por que las noticias son tan similares? Será porque todas reflejan la verdad, y verdad no hay más que una? No seria más lógico caer em la cuenta de que lãs noticias coinciden porque han sido producidas em fábricas que han optimizado al máximo la cadena de montaje? No hay tanta diferencia entre la concepción, producción, comercialización y consumo de um coche y uma notícia (XAXÀS, 2005:43).


As citações dos autores europeus são utilizadas aqui para reforçar o conteúdo trazido por Dornelles e Biz no recém lançado livro Jornalismo Solidário. A obra assinala, também, que, como a Mídia eletrônica é uma concessão de serviço público, a sociedade deve saber quem são os permissionários e quando se esgota o prazo da concessão. Mas essas informações não são facilmente disponibilizadas ao público. Dizem os autores: “Cidadania significa, também, ter capacidade de ler a Mídia e de questionar suas estratégias, de modo a não repetir pura e simplesmente o que ela conseguiu transformar em senso comum” (DORNELLES & BIZ, 2006:45).


O livro constitui-se em importante contribuição para quem trabalha ou estuda a Mídia contemporânea e sua influência social. É importante saudarmos a expansão da Mídia mas é preciso, também, questionar e fiscalizar criticamente esse crescimento.


O jornalismo é pratica de mediação discursiva. Existe para nos contar o que aconteceu, como e porque aconteceu. Mas, sem dúvida, quem conta o que vê, conta sua visão do que viu. Há lentes e filtros ideológicos que determinam escolhas e recortes na produção e veiculação de notícias. Quanto mais procuramos a verdade, mais encontramos a verdade que querem nos mostrar.E o livro Jornalismo Solidário traz excelentes recursos para ajudar-nos não apenas para “ler” mas, também, “enxergar” o que a Mídia nos mostra.


Fiz as citações dos quatro autores acima e seus livros para agora introduzir a questão que considero central no debate: a importância do diploma para exercer o bom jornalismo. Além dos autores acima citados poderia escolher centenas de outros autores e seus livros. Mas fiz uma escolha. Jornalismo é isso. É escolher, recortar, resumir a informação que será transmitida. Nós, jornalistas, somos mediadores entre o fato que virou notícia e o público que será informado.


Qualquer um pode fazer isso? Claro que não. Muitos dizem que sim. Aliás, quanta gente gosta de se fazer passar por jornalista. Mas é fundamental que a profissão seja exercida por quem se qualificou para isso. Sou jornalista há mais de 30 anos, com passagem em diversas redações de jornais e TVs do Brasil. Sou professor de jornalismo há 15 anos, em universidades públicas e privadas. Mas não pensem que estou defendendo o diploma por uma questão de reserva de mercado. Nada disso. Eu mesmo testemunhei em várias redações por onde passei gente desqualificada e oportunista querendo exercer a função de jornalista, sem qualificação para tal. Os resultados sempre foram desastrosos. Principalmente para quem recebe a informação.Quando o leitor está comprando um jornal ele está exercendo o seu direito de ser corretamente informado por quem se qualificou para informá-lo da melhor maneira possível. E do profissional jornalista deve-se exigir, além do diploma, uma conduta séria, baseada na honestidade e nos princípios éticos que norteiam nossa profissão.


Imparcialidade? Bem essa é difícil de atingir. Por trás de qualquer imagem está o olho do jornalista. Ele faz o recorte, faz a escolha, decide o que vai mostrar. Logo, ele não é imparcial. Ele tem lado, escolheu uma posição para dali fazer sua observação. O jornalista não pode ser imparcial, mas deve ser honesto. Deve ter a determinação de mostrar o máximo possível do que apurou para o público consumidor da notícia faça sua avaliação.E essa é uma atitude que exige conhecimento, capacidade de discernir, de separar os fatos banais do cotidiano daqueles que efetivamente vão virar notícia.Faço assim, a defesa intransigente da exigência do diploma para o exercício da profissão de jornalista e recorro aqui ao que diz Mino Carta sobre o assunto:Do profissional de comunicação exige-se honestidade. Na Mídia nativa, a alegada busca da imparcialidade e da objetividade serve apenas como adubo da hipocrisia. Jornais, revistas, meios de comunicação em geral, apóiam o Poder pelo simples fato de que fazem parte dele, são seu instrumento. Ou, por outra, apóiam a si mesmos, sem qualquer preocupação quanto à honestidade (CARTA, 2002:18).


Com a citação de Mino Carta, um exemplo aos jornalistas brasileiros, encerro essas breves linhas, reiterando minha convicção absoluta de que só teremos um Brasil melhor se cada um fizer adequadamente o seu papel. E a Imprensa é fundamental nessa reconstrução. Só teremos uma Imprensa forte, que ajude o país a encontrar seu rumo, se ela for exercida por profissionais qualificados (e diplomados!). Ética aprende-se na escola, sim. E é lá nos bons cursos de jornalismo que continuarão a ser formados os verdadeiros jornalistas brasileiros, preocupados cada vez mais em dignificar nossa nobre profissão.Afinal, a vida sempre nos surpreende com algo que não fora previsto. E o sentido que nós damos às coisas é o que vai dar uma ou outra direção à vida. A Viagem é o espaço compreendido entre o “onde estamos” e o “para onde vamos”. O caminhante faz seu caminho. E a estrada muda conforme o olhar de quem está viajando.Nós, jornalistas, temos esse papel. Vamos conduzir a informação precisa, exercer a fiscalização crítica, provocar inquietação, levantar questões, enfim, instigar. E assim estaremos dando nossa contribuição para a construção de um país melhor para todos nós que vivemos nele e para os que nele vierem a viver.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CARTA, Mino. Carta Capital. Ano VIII, nº 209, de 02/10/2002, p.18

DORNELLES, Beatriz & BIZ, Osvaldo. Jornalismo Solidário. Porto Alegre: GCI, 2006.

THOMPSON, John – Ideologia e cultura moderna – Teoria social crítica na era dos meios de comunicação de massa. Petrópolis: Vozes, 1995.XAXÀS, Xavier Mas de. Mentiras – Viaje de um periodista a la desinformación. Barcelona: Ediciones Destino, 2005.

* Jornalista e advogado, Mestre e Doutor em Comunicação. É professor de jornalismo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). É autor dos livros: No ar: TV Universitária – limites e possibilidades (Edipucrs, 2002) e Telejornalismo: a praça pública da atualidade (Insular, 2006)

Texto retirado do site da Fenaj
www.fenaj.org.br

Thursday, September 22, 2005

DESENVOLVIMENTO DA RADIODIFUSÃO COMUNITÁRIA NO BRASIL (continuação)

Por Márcia Detoni

A história das rádios comunitárias no Brasil está ligada ao surgimento das rádios livres, na década de 1970, época em que os meios de comunicação de massa estavam predominantemente nas mãos de pessoas ou grupos ligados ao poder
A primeira rádio livre de que se tem conhecimento foi a Paranóica, de Vitória-ES, inaugurada em outubro de 1970 por um adolescente de 16 anos, Eduardo Luiz Ferreira da Silva, amante de eletrônica. A emissora tocava músicas e fazia críticas a figuras da cidade, mas foi logo desativada. Eduardo e seu irmão de 15 anos, que ajudava nas transmissões, chegaram a ser presos sob acusação de subversão no auge da repressão militar.
Em 1976 foi a vez da Rádio Spectro, montada por outro adolescente, agitar a cidade de Sorocaba. O garoto de 14 anos transmitia duas horas por dia, recebendo até 20 telefonemas diários de ouvintes. Terra de muitos técnicos e estudantes de eletrônica, Sorocaba chegou a ter, segundo a imprensa local, cerca de 40 emissoras livres no início da década de 1980. A brincadeira acabou sendo interrompida pela ação das autoridades, mas não sem antes contagiar outros locais.
Em 1985, a capital paulista contava com dezenas de emissoras clandestinas e até com uma "cooperativa de rádio-amantes". Em um primeiro momento, as rádios livres eram uma iniciativa de jovens cansados da mesmice das FMs oficiais. Estavam interessados apenas em rock e na arte da radiofonia. Na década de 1980, com a ditadura militar dando sinais de esgotamento, começaram a surgir emissoras críticas à centralização dos meios de comunicação.
Segundo um pequeno manifesto da Cooperativa dos Rádio-Amantes de São Paulo, a intenção do grupo era promover uma reforma no espectro
radiofônico: "Iniciamos um movimento de reforma agrária no ar. O rádio é uma conquista técnica da humanidade e não pode ficar nas mãos [...] de proprietários-concessionários".
A Rádio Xilik, inaugurada em julho de 1985 no campus da PUCSP por alunos de ciências sociais, é o símbolo desse movimento pela democratização da comunicação. Os fundadores da emissora (Caio Magri, Arlindo Machado e Marcelo Masagão) foram fortemente influenciados por experiências européias de rádios piratas, principalmente as da Itália e da França.
Embora em número bem menor, também há registros nessa época de rádios livres fazendo transmissões com cunho essencialmente político. Os bancários de São Paulo colocaram no ar, em 1985, a Rádio Tereza, com 120 Watts de potência. Tereza é a corda que os prisioneiros fazem com os lençóis para fugir da cadeia. O nome foi escolhido simbolicamente, como uma tentativa de fuga da "cadeia global" que domina a comunicação.
A década de 1980 também representou o apogeu, no País, das rádios de alto-falantes, as chamadas "rádio-corneta", "rádio-poste", ou "rádio popular", o meio que muitas comunidades encontraram para levar suas mensagens aos moradores locais.
Na zona leste de São Paulo, essas emissoras começaram a surgir em
1983 e, em 1988, havia 42 delas. Aos poucos, no entanto, as "rádios-corneta" entraram em declínio e começaram a surgir as emissoras comunitárias propriamente ditas, sob a constante repressão da Polícia Federal e do Departamento Nacional de Telecomunicações - DENTEL, substituído pela Agência Nacional de Telecomunicações - ANATEL, empenhados em apreender equipamentos e fechar as emissoras, muitas vezes prendendo os responsáveis e levando-os a julgamento.
Os primeiros registros de emissoras livres operando com caráter fortemente comunitário são de 1990. Na época, destacam-se a atuação da Rádio Livre Paulicéia, em Piracicaba-SP, que operou de julho de 1990 a abril de 1992, e a Rádio Novos Rumos, surgida em dezembro de 1990 em Queimados, município da Baixada Fluminense (RJ).
A Paulicéia, com 10 Watts de potência, era de propriedade dos moradores e gerida por um conselho coordenador escolhido por voto.
Atuava com base em uma assembléia composta de 120 pessoas que debatia o papel da emissora e sua programação. Não tinha fins lucrativos e contava com a participação intensa da comunidade tanto nas decisões como na produção de programas, recebendo de 30 a 40 telefonemas diários com sugestões, recados e perguntas. Cedia espaços para católicos (pastoral da juventude, movimento carismático), evangélicos, crianças, grupos de desempregados, grupos musicais, etc. No ar por até 120 horas semanais, chegou a ser a emissora mais ouvida da cidade. Mas foi fechada pela Polícia Federal.
A Novos Rumos também surgiu com caráter fortemente comunitário e, depois de ter sido fechada várias vezes, é hoje uma das mais ouvidas em Queimados. O estatuto da emissora garante a todo cidadão o direito de voz na programação. As diretrizes da emissora são elaboradas em assembléias semestrais com os associados, mas quem conduz a rádio no dia-a-dia é um conselho executivo de cinco membros. Os associados, cerca de 800, pagam uma mensalidade simbólica, mas as principais fontes de receita são os comerciais e prestação de serviços de áudio para terceiros.
Em 1995, o então ministro das Comunicações, Sérgio Motta, anúncia a intensão de formar uma comissão para elaborar uma proposta de regulamentação para as emissoras de baixa potência em todo o País. Isso estimula o surgimento de centenas de novas rádios, que começam a formar organizações para a defesa de suas emissoras.
A Associação Brasileira de Rádios Comunitárias - ABRAÇO é criada em
1996 para organizar e representar as emissoras de baixa potência.

DESENVOLVIMENTO DA RADIODIFUSÃO COMUNITÁRIA NO BRASIL

Por Márcia Detoni

A Associação Brasileira de Rádios Comunitárias - ABRAÇO é criada em 1996 para organizar e representar as emissoras de baixa potência. Ela e outras entidades, como o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, passam a organizar encontros sobre radiodifusão livre e comunitária e contribuem na elaboração das propostas de lei apresentadas no Congresso Nacional para a legalização das emissoras comunitárias. Em fevereiro de 1998, o Congresso Nacional aprova a Lei nº 9.612/98 instituindo o Serviço de Rádio Comunitária. Apesar de representar um avanço por finalmente regularizar o segmento, a lei impõe uma série de restrições que, segundo os representantes das rádios comunitárias, praticamente inviabilizam a atuação das emissoras:

- só permite a operação de emissoas com até 25 Watts de potência e antena inferior a 30 metros, o que restringe o alcance em áreas de alta densidade urbana ou cercadas por montanhas;

- autoriza o funcionamento de apenas uma rádio por vila ou bairro, sem levar em conta o tamanho da população;
- obriga todas as emissoras a operar na mesma freqüência, impedindo a coexistência de rádios comunitárias em bairros próximos;
- proíbe a formação de redes;
- proíbe a propaganda.

A única forma de patrocínio permitida é o apoio cultural, o que dificulta a obtenção de recursos para a manutenção de equipamentos, compra de discos, produção de programas, pagamento de funcionários. As restrições legais à radiodifusão comunitária são o resultado da pressão da Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão - ABERT, patronal, sobre o governo e o Congresso. Desde meados da década de 1990, a ABERT desenvolve intensa campanha contra as rádios comunitárias temendo perder audiência e receita publicitária em um universo radiofônico cada vez maior e mais variado. O papel das rádios comunitárias não é, no entanto, disputar mercado com as emissoras convencionais públicas ou privadas. As emissoras de baixa potência são apenas uma opção a mais no universo midiático e surgem para suprir uma lacuna existente nas emissões tradicionais. Seu principal objetivo é proporcionar à comunidade a possibilidade de acesso aos meios de comunicação, além de uma programação de cunho social que não encontra espaço nas demais emissoras.

RÁDIOS COMUNITÁRIAS: REVOLUÇÃO NO AR

Por Márcia Detoni

Do topo das grandes favelas brasileiras aos pequenos municípios do semi-árido brasileiro, as rádios comunitárias estão modificando o panorama das comunicações no País. Os dados revelam um crescimento gigantesco, na última década, das transmissões de rádio em todo o País, restrito, até então, à programação das cerca de 3.500 emissoras privadas e públicas autorizadas a figurar no dial. Mas, mais que um salto numérico, o boom de emissoras comunitárias evidencia a redescoberta do potencial do rádio como meio de comunicação e de democratização da informação, um fenômeno que vem ocorrendo não só no Brasil, mas em todo o mundo em desenvolvimento.
Em plena era da Internet, a mais antiga das tecnologias de comunicação é o que há de mais revolucionário. Enquanto a maioria das pessoas do mundo ainda está longe de chegar perto de um computador, novas emissoras brotam em todos os cantos do mundo em desenvolvimento. À medida que as ditaduras caem e a democracia se fortalece, os governos flexibilizam a concessão de freqüências e a própria população se apodera do rádio como veículo de expressão de suas culturas e anseios, fazendo dele um instrumento de inclusão e de desenvolvimento local.
Infelizmente, como reconhece a própria ABRAÇO, a maioria das emissoras de baixa potência que se intitulam comunitárias no Brasil não cumpre um papel social. Elas têm, de maneira geral, um cunho religioso, eleitoral ou comercial e reproduzem a lógica e a programação das emissoras privadas. Tais distorções não invalidam, no entanto, a importância da regulamentação da radiodifusão comunitária no País. Ao contrário. A legislação precisa ser aperfeiçoada para que esse tipo de emissora cumpra, de fato, o papel a que se propõe. Uma verdadeira rádio comunitária, de acordo com a definição teórica, tem algumas características de programação e de gerenciamento que a diferenciam de forma significativa das emissoras comerciais e mesmo das emissoras públicas ou estatais:

* programação voltada para os problemas e realidades do bairro ou região, que valorize a cultura local e tenha um forte compromisso com a educação para a cidadania;
* participação direta da população ao microfone e na produção dos programas;
* participação da comunidade no gerenciamento e na definição dos programas da emissora por meio de assembléias coletivas;
* finalidade não-lucrativa.

Os recursos para o funcionamento da emissora são arrecadados através de apoio cultural e de contribuições da comunidade. Os estudiosos da radiodifusão comunitária tendem a ser rígidos na conceituação desse tipo de emissora, mas a AMARC (Associação Mundial das Rádios Comunitárias) adota um conceito flexível e mais próximo da realidade de suas afiliadas, muitas das quais não têm, por exemplo, o gerenciamento participativo ou dependem da venda de anúncios comerciais:
Quando uma rádio promove a participação dos cidadãos e defende seus interesses; quando responde aos gostos da maioria e faz do bom humor e da esperança sua primeira proposta; quando informa de forma veraz; quando ajuda a resolver os mil e um problemas da vida cotidiana; quando em seus programas se debatem todas as idéias e se respeitam todas as opiniões; quando se estimula a diversidade cultural e não a homogeneização mercantil; quando a mulher protagoniza a comunicação e não é apenas uma simples voz decorativa ou um anúncio publicitário; quando não se tolera nenhuma ditadura, nem sequer a musical imposta pelas gravadoras; quando a palavra de todos voa sem discriminação, sem censuras, essa é uma rádio comunitária.
Para o autor e pesquisador boliviano Alfonso Gumuncio Dragon, mesmo a mais precária das emissoras de baixa potência com uma programação totalmente musical inicia um processo de transformação em sua comunidade. Ela contribui para criar um sentimento de unidade, de solidariedade e de pertencimento, que é essencial ao desenvolvimento.
A presença de uma emissora comunitária mesmo que não totalmente participativa, tem um efeito imediato na população. Pequenas emissoras geralmente começam a transmitir música na maior parte do dia, tendo assim um impacto na identidade cultural e no orgulho da comunidade. O próximo passo, geralmente associado à programação musical, é transmitir anúncios e dedicatórias, que contribuem para o fortalecimento das relações sociais locais. Quando a estação cresce em experiência e qualidade, começa a produção local de programas sobre saúde ou educação. Isso contribui para a divulgação de informações sobre questões importantes que afetam a comunidade.
Um bom exemplo desse processo é a própria Rádio Favela FM, de Belo Horizonte, reconhecida internacionalmente por sua atuação comunitária. A emissora surgiu na década de 1980 com uma programação exclusivamente musical. Hoje, investe forte também em conteúdo e já ganhou dois prêmios da ONU por sua contribuição ao combate ao tráfico de drogas, à violência e ao racismo. Na Favela FM se ouve um pouco de tudo, desde debates sobre direitos humanos ou abuso sexual, até críticas ao governo e histórias infantis. Portanto, entre milhares de emissoras de baixa potência que hoje não se enquadram no conceito teórico e legal de rádio comunitária pode haver sementes que, se frutificadas, levarão a uma comunicação democrática e plural, que ofereça amplas possibilidades de expressão e desenvolvimento a suas comunidades.
Cabe a associações como a AMARC e a ABRAÇO, às organizações não-governamentais e às universidades contribuir com esse processo, ajudando na capacitação das emissoras comunitárias, para que, em médio prazo, possam vir a pôr no ar uma programação criativa, com relevância de conteúdo e qualidade técnica.

Monday, September 12, 2005

Fidelidade dos leitores e anunciantes garantirá crescimento da imprensa de bairro




"... uma parceria de mais de 20 anos com os jornais comunitários, que mesmo com muitas dificuldades comerciais, e até mesmo operando no vermelho, continuam resistindo."

"No início dos anos 90, ZH fez o mesmo e pouco depois desistiu do projeto, sem consultar a comunidade, deixando apenas a frustração de não ter levado a cabo as promessas editoriais."

Por Beatriz Dornelles

O jornal Zero Hora surpreendeu a todos, jornalistas e comunidades de bairro, ao anunciar que estaria lançando em agosto quatro cadernos de bairro: no dia 5, Bom Fim (mais Santana e parte de Rio Branco); no dia 12, Moinhos de Vento (mais Auxiliadora. Independência, Floresta e parte de Rio Branco); no dia 19, Bela Vista (mais Mont' Serrat, Três Figueiras e Boa Vista) e dia 26 Zona Sul (Ipanema. Tristeza, Sétimo Céu, Assunção e Vila Conceição). Em entrevista ao site Coletiva.Net, o presidente da Associação dos Jornais de Bairro e Segmentados de Porto Alegre -Rede Jornal, Roberto Corrêa Gomes, declarou que estranhou a iniciativa de ZH, já que todos os bairros em que serão lançados os cadernos já têm jornais sólidos, com circulação plena e estão totalmente envolvidos com as regiões representadas.
O estranhamento do presidente não é à toa. Já no inicio dos anos 90, a Zero Hora fez a mesma coisa e poucos meses depois desistiu do projeto, sem nenhuma consulta à comunidade, deixando apenas a frustração de não ter levado a cabo as promessas editoriais realizadas antes do lançamento do projeto. Ou seja, não houve nenhum comprometimento por parte de Zero Hora com os problemas sociais e reivindicações das diversas comunidades de Porto Alegre. Nesta segunda investida, apresentada ao público no dia 5 de agosto, ZH destacou apenas um repórter para realizar as reportagens e acompanhar as atividades e reuniões das quatro áreas. O mesmo profissional precisa fazer as fotografias, pois não foram designados fotógrafos para a cobertura de fatos dos bairros. Há, ainda, um editor e um diagramador. As mesmas áreas contam com a presença de cerca de 20 jornalistas dos jornais de bairro que circulam nas regiões selecionadas pela Zero Hora.
Esta postura nos leva a acreditar que o objetivo deste jornal e prioritariamente comercial. Tal julgamento baseia-se também numa análise editorial dos cadernos de Zero Hora. Eles não apresentam nenhuma novidade editorial, ao contrário, copia o que já está sendo praticado pêlos jornais de bairro de Porto Alegre. Aliás, com tantos profissionais competentes e criativos, não haveria necessidade de repetir as propostas editorias dos jornais já existentes.
Por exemplo, praticamente todos os jornais de bairro, e alguns segmentados, há mais de 20 anos têm seções para contar a história das ruas, praças e prédios do local. Desde os anos 90, os jornais de bairro ampliaram a aproximação com as associações de moradores, com os lideres comunitários e com a população em geral.
A seção de cartas é uma tradição em praticamente todos os jornais em circulação. Entrevista com lideranças, artistas, empresários. trabalhadores do bairro foi uma das primeiras propostas postas em prática pelo jornal Oi!, no Menino Deus. O tema envolvendo o meio ambiente tem sido uma luta constante do Já, Folha 3, Bela Vista, Jorna-lecão. Fala! São João, além de todos os outros que também dão ampla cobertura aos movimentos que envolvem o setor.
As atividades comunitárias da Brigada Militar foram acompanhadas desde o inicio (década de 90) por todos os jornais de bairro. Seções dirigidas a crianças e adolescentes também são iniciativas de alguns jornais de bairro, destacando-se o Folha 3, que desde suas primeiras edições dedica uma página para os adolescentes.
Divulgação de diferentes cultos e de religiões faz parte da pauta mensal de todos os jornais, bem como a cobertura de esporte local. Casamentos, batizados e mortes são temas de alguns jornais de bairro, há anos, como é o caso do Destak e do Zona Norte. Também a culinária ou gastronomia é um assunto que faz parte da tradição dos jornais.
Sendo esses os temas abordados pêlos cadernos de bairro de Zero Hora, não há nenhuma novidade apresentada, apenas uma cópia do que já é feito pêlos tradicionais jornais de bairro de Porto Alegre. A grande diferença está no fato dos jornalistas da imprensa de bairro estarem totalmente integrados nas atividades dos moradores dos bairros onde circulam e os profissionais de Zero Hora não terem nenhum afinidade com a vida comunitária dos bairros.
Não se pode deixar de destacar, também, que os cadernos de Zero Hora, que têm tabela de preços exclusiva, estão sendo comercializados com base nos preços dos jornais de bairro. Assim, concluímos que a motivação de Zero Hora para cobrir os bairros é comercial. Ou seja, ela pretende "conquistar" os anunciantes que tradicionalmente anunciam na imprensa de bairro. Essa postura é altamente danosa para comunidade. Por isso acredito que os 34 jornais de bairro de Porto Alegre mais os cerca de 20 jornais segmentados devem fazer uma campanha de esclarecimento, de forma que a comunidade e os anunciantes tenham elementos para se posicionar: ou abandonam uma parceria de mais de 20 anos com os jornais comunitários para apoiar uma novidade que, se apresentar dificuldades comerciais, pode acabar a qualquer momento, ou continuam apoiando a mídia comunitária, que mesmo com muitas dificuldades comerciais e até mesmo operando no vermelho continuam resistindo. O que não pode ser ignorado é a ganância e a concorrência desleal, praticada pela imprensa de massa, pois os pequenos jornais comunitários não contam com nenhuma estrutura para enfrentar poderosas forças empresariais, a não ser com a lealdade dos moradores e a confiança dos anunciantes. Esperamos que estes sejam fiéis ao trabalho desenvolvido pêlos jornais de bairro ao longo dos últimos 20 anos.

Jornalista, professora com Doutorado em Jornalismo pela ECA/USP. c pesquisadora do Programa de Pós-Grauuaçâo da Famecos/PUCRS

Friday, September 02, 2005

Voluntário ou Obrigatório: O Balanço Social


A idéia da responsabilidade social não é nova, mas nos anos recentes tem contagiado as empresas. É cada vez maior o número de empresas que apresentam o Balanço Social por livre iniciativa. Uma das razões é a necessidade do setor privado de se aproximar dos clientes e conseqüentemente da comunidade local. Um dos caminhos para isso é abrir os olhos do mercado e apontar o que cada um pode fazer pelo social. O Balanço Social é isto mostrar com transparência o que faz cada um.
Neste aspecto as grandes empresas têm papel fun­damental, pois representam os grandes investimentos, as gran­des compras e a grande parcela dos consumidores. O Banco do Brasil é um exemplo desse papel. Sendo uma instituição que pu­blica o seu Balanço, ele pode cobrar também dos seus fornecedo­res uma postura social diferenciada. "Existe entre empresas uma cadeia de relacionamento, é óbvio que se começar a colocar exi­gências isso vai mudar", explica o gerente da área de relação com o investidor do Banco do Brasil, Gilberto Lourenço.
Para não perder o trem da história o Congresso Na­cional quer legislar sobre o assunto. Em Projeto de Lei, o senador, Ney Suassuna, quer uma prestação de contas sociais obrigatória por parte das empresas. Pelo projeto, junto a Declaração do Im­posto de Renda, as empresas estariam obrigadas a declarar, em documento separado, o que investiu em patrocínios culturais, ci­entíficos e esportivos. "Isso tudo daria um maior controle por parte da sociedade dos impostos pagos ao governo, ao mesmo tempo em que valorizaria a própria empresa junto à sociedade", acredita Ney Suassuna. Para Gilberto Lourenço do BB, a obrigatoriedade de declarar ações sociais pode se tornar burocrática. "Questão social independe da lei, sociedade já se antecipou", conclui o ge­rente do banco.
Na verdade, assim como o Balanço Social, a idéia de uma legislação sobre o assunto não é nova. Desde 1977 a França tornou obrigatória a realização periódica de um Balanço.
No es nuevo el concepto de responsabilidad social, pero sólo re­cientemente las empresas han adheri­do a él. Gerisse cada vez más el número de empresas que presentan su Balance Social expontaneamente. Aproximarse a sus clientes y tener contacto más direto con la comunidad local, son razones para este comportamiento. Un camino directo para el mismo es abrirle los ojos al mercado e indicarle a cada uno qué puede hacer por 10 social. Esto es Ba­lance Social, mostrar con transparencia 10 que cada uno hace.
En este aspecto las gran­des empresas desempenan un rol pre­ponderante, ya que representan las grandes inversiones, grandes compras y grandes fajas de consumidores. EI Banco del Brasil es un claro ejemplo de ese papel. Por tratarse de entidad oficial puede exigir de sus proveedores una postura social diferente. "Las empresas están atadas por eslabones en sus re­laciones, y claro está, comenzando a exi­gir la situación tendrá que cambiar", comenta el gerente del área de relacio­nes con los inversores del Banco del Brasil, Gilberto Lourenço.
Para estar acorde con el momento el Gongreso Nacional quiere legislar sobre el asunto. Existe un Pro­yecto de Ley, presentado por el senador Ney Suassuna, obligando a las empresas a una rendición de cuentas sociares. Según el proyecto, las empresas en ocasião de la presentación de su Declaración de Impuesto a la Renta, se obligarían a declarar, por separado, las inversiones en patrocínios culturales, científicos y deportivos. "Tendría así la sociedad mecanismo de control sobre los impuestos pagados al gobierno, a la vez que se valorizaría la propia empresa ante ella", confía el Senador. Gilberto Lourenço dei BB, con­sidera que esta obligatoriedad puede ha­cerse burocrática. "La cuestión social no depende de leyes, la sociedad llegó pri­mero.

No Brasil a utilização do Balanço é mais recente. Mesmo assim, algumas iniciativas demonstra­ram a preocupação com.o assunto já na década de 80. a Balanço Social da Nitrofértil, empresa estatal situada na Bahia, realizado em 1984, é considerado o primeiro docu­mento brasileiro do gêne­ro, que carrega o nome de Balanço Social. No mesmo período, esta­va sendo realizado o Balanço do Siste­ma Telebras, publi­cado em meados da década de 80. Em 1988 surgia também a Funda­ção Banco do Bra­sil, que atualmente é um dos pontos mais fortes no Ba­lanço do banco. É a fundação, por exemplo, responsá­vel pelo projeto BBeducar, que já alfa­betizou mais de 60 mil jovens e adultos com aju­da de voluntários e instruto­res do BB.

Sobre a discussão em torno de uma lei para o Balanço Social existe uma unanimidade, as empresas terem saído na frente já é um tempo em que valorizaria a bom sinal, se a sociedade cobrar esse tipo de atitude antes que a lei o faça, será melhor ainda. A preocupação do Terceiro Setor com uma lei que obrigue a declaração do Balanço Social tem motivos para existir. Afinal, a história do país mostra que umas leis pegam, outras não. Para Ney Suassuna não há nada a perder com a obrigatoriedade do balanço, apenas a ganhar. A pesquisadora do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, IPEA, Ana Peliano, con­corda com o gerente do Banco do Brasil. Ela acredita que o mais importante é uma cobrança direta da sociedade. a que, na opinião da pesquisadora, já está acontecendo. Seja qual for o caminho do projeto em discussão no sena­do, espera-se que a vitoriosa seja a sociedade.

Atração por escândalos

Escandalosa. Ser ou não ser?
Eis a questão que desafia a imprensa eu­ropéia. Na Inglaterra, dos tablóides
sensacionalistas, apesar dos ventos contrá­rios que jornais como o Sun vêm enfrentan­do, a imprensa sensacionalista que explora escândalos - de preferência sexuais -. fofo­cas, faits divers e entretenimento continua com tiragens milionárias. O SW1, por exem­plo, vende 3,7 milhões de exemplares. Já vendeu quatro milhões, mas os excessos co­metidos na cobertura da morte da princesa Diana parecem ter deflagrado um certo des­contentamento do público com a imprcnsa sensacionalista.
Este tipo de imprensa se beneficia das leis extremamente liberais existentes na In­glaterra e de urna interpretação bem ampla do que seria um código de ética por parte das entidades profissionais que congregam os jornalistas ingleses. Os leitores atraídos pelos jornais populares são basicamente jo­vens operários e funcionários não qualifica­dos. principalmente do sexo masculino. Ainda não se pode falar em crise, mas o pú­blico da imprensa sensacionalista vem dimi­nuindo, preferindo ver mais televisão ou mesmo comprar os jornais tradicionais que dedicam cada vez mais espaço para assun­tos populares, esportes e entretenimento. A família real é um dos alvos prediletos da im­prensa popular e são poucos os instrumen­tos jurídicos com que ela conta para prote­ger sua privacidade.

Na França, a situação é totalmente dife­rente. Leis muitas rígidas e um código de éti­ca extremamente rigoroso garantem a priva­cidade dos cidadãos. A diferença entre o pú­blico e o privado é claramente delimitada e respeitada e as penas para quem cruza inde­vidamente a fronteira são pesadas, tanto financeira quanto juridicamente. Durante o governo de François Mitterrand. por exem­plo, toda a imprensa francesa sabia da existência de uma filha, Masarine, que o presidente tinha tido de uma outra relação. No entanto, isto só foi noticiado, quando Mitterrand enviou claros sinais que não queria mais manter o segredo. No enterro do presidente morto em 1996 vitimado por complicações causadas por um câncer, as duas famílias participaram juntas de todas as solenidades oficiais. Aliás, na morte do presidente,a im­prensa francesa deu outra manifestação de civilidade. Apesar de ser do conhecimento de todos que Mitterrand agonizava em seu apar­tamento particular. nenhuma equipe de jor­nalistas dava plantão diante do edifício. A notícia da morte foi divulgada oficialmente pelo presidente Jacques Chirac.
Tanta civilidade não impediu. no entanto que no velório privado alguém tivesse feito uma foto do corpo do presidente com uma minicâmera e a vendesse para o Paris Match que a publicou. Foi um escândalo. (E.S.)

Monday, July 11, 2005

Considerações sobre o colunismo no Brasil

A COLUNA[1]

A coluna é uma espécie de área privativa com regulamento próprio onde se misturam em intimidade, sobre assuntos gerais ou temas específicos, notícia e comentário, entrevista e interpretação, humorismo e gravidade, tudo em textos curtos, em forma de pílulas, e com certa liberdade de expressão. É o dado que faltou ao grande noticiário, o lado pitoresco do acontecimento, o detalhe curioso de uma decisão.
A idéia de delimitar a coluna e dar-lhe essa característica surgiu simultaneamente no fim do século 19, nos Estados Unidos, com Eugene Field, no Daily News, de Chicago, e Ambrose Bierce, no Examiner, de São Francisco, como reação ao rigor na separação e emprego da notícia e do comentário, e à camisa de força dos editoriais. O colunismo, como ficou conhecido, teve aceitação imediata na imprensa brasileira.
A sua receptividade entre os brasileiros também foi favorecida pelo cansaço dos leitores com os longos comentários, e não só pó isso como pelo toque de humor e malícia que muitos profissionais souberam dar à redação dos pequenos textos. Hermano Alves (colunista) disse que “nada melhor do que uma pitada de malícia para dar sabor a uma coluna”.
Paradoxalmente, o êxito de uma coluna concorre, não raro, entre nós, para sua desfiguração. Local de fácil comunicação transforma-se em abridora de caminhos ou salão de sondagem de determinados grupos. Em outros momentos, é a vala comum de notícias menores de interesse da direção da empresa, de suas relações, das agências de relações públicas e publicidade, e dos amigos do colunista. A constância das pessoas acaba, às vezes, por triunfar sobre a ética profissional e, entre duas notícias qualificadas, o leitor é obrigado a consumir a promoção de um cliente importante do jornal.
O colunista disputa com o repórter o prazer da notícia em primeira mão, com o redator a capacidade de dizer o máximo com o mínimo de palavras e com o comentarista a sutileza de espírito, a perspicácia e a finura. Tem que ser um jornalista experiente no trato da entrevista e com ampla possibilidade de circulação em todas as áreas.
O campo de ação do colunista são os grandes centros de decisão, os bastidores, as reuniões sociais, os acontecimentos mundanos. Muito material surgiu também da colaboração entre colegas da mesma ou de diferentes empresas.
O fato de reunir toda uma soma de poder em suas mãos e de comentar temas os mais variados, como um especialista polivalente, tem causado apreciações negativas ao colunista, como esta feita por uma autoridade norte-americana:
De todas as fantásticas figuras que se têm levantado do pântano da confusão, desde a Grande Guerra, a mais fútil e, ao mesmo tempo, a mais pretensiosa, é a do profundo pensador de cabelo empastado, o colunista ou comentarista que sabe todas as respostas de improviso e pode resolver grandes problemas com absoluta confiança, três e até seis dias da semana.

Mesmo John Hohenberg, que elogia alguns colunistas por sua capacidade de iluminar as notícias e trazer algum esclarecimento diz que “alguns são modestos, mas outros insuportavelmente arrogantes ao pretenderem modelar a opinião pública”.
Não é raro o colunista tornar-se mais importante do que o próprio jornal e por esse motivo um dos grandes matutinos do Rio de janeiro, o Correio da Manhã, hoje extinto, sempre se negou a introduzir qualquer coluna com as características que marcam este gênero no jornalismo.
Em que pesem, porém, as críticas feitas aos colunistas, o fato é que a coluna vive uma fase de prestígio graças ao volume de informação que fornece à leveza e ao tamanho reduzido dos textos.

[1] Texto de Luiz Amaral, em “Jornalismo, matéria de primeira página”, ed. Tempo Brasileiro, 1986.